Ruth de Souza: 100 anos de arte e inspiração. Atriz carioca, que completaria 100 anos nesta quarta-feira (12), recebe homenagem do Google. Artistas também fazem homenagens e agradecem o legado deixado pela atriz.
É o caso de Zezé Motta que postou no Instagram: “Imortal. Lendária. Icônica”. Assim a também dama do teatro e do cinema Zezé Motta define a atriz e amiga Ruth de Souza (Rio de Janeiro, 1921-2019), que completaria 100 anos nesta quarta-feira, 12 de maio de 2021.
Pioneira nos palcos e nas telas, Ruth de Souza revolucionou a arte e os costumes do Brasil ao ser a primeira atriz negra a atuar, há 76 anos, no Theatro Municipal do Rio de Janeiro, com a encenação da peça O Imperador Jones, do dramaturgo norte-americano Eugene O’Neill (1888-1953), pela companhia de Teatro Experimental do Negro (TEN), fundado e liderado pelo ator, ativista e político Abdias do Nascimento.
Ruth de Souza era filha de um lavrador e uma lavadeira. Apesar de ter nascido no Rio, passou a infância em Minas Gerais. Costumava contar que a paixão pela sétima arte foi à primeira vista, quando ainda criança assistiu ao filme Tarzan, o filho da selva (1932). Decidiu então que seria atriz, ainda que não soubesse como o faria. Afinal, havia até então poucas referências de atrizes e atores negros no cinema e no teatro, não só no Brasil, mas no mundo. “Queria ser atriz, mas naquela época não tinha atores negros, e muita gente ria de mim”, contou ela, em entrevista exibida em 2014 pela Globo.
Voltou ao Rio de Janeiro aos nove anos com a mãe, após a morte do pai. Anos mais tarde, leu uma reportagem sobre o Teatro do Estudante do Brasil (TEB), grupo que deu origem ao TEN, fundado em 1944 no Rio, e que a levaria aos palcos do prestigioso Theatro Municipal da capital fluminense em 8 de maio de 1945. “Foi lindo aquele dia. A gente celebrando nossa estreia, e o mundo festejando o fim da Segunda Guerra Mundial. O centro da cidade estava lotado”, narrou a atriz, em entrevista ao jornal O Globo.
A estreia no cinema aconteceu pouco depois, em 1948, quando integrou ―por indicação do escritor baiano Jorge Amado ― o elenco de Terra Violenta, adaptação da obra Terras do Sem-Fim, ao lado de nomes como Grande Otelo (1915-1993) e Anselmo Duarte (1920-2009). Dois anos depois, conquistou uma bolsa de estudos pela Rockefeller Foundation para cursar teatro e cinema nos Estados Unidos por um ano.
De volta ao Brasil, atuou no filme Sinhá Moça (1953), dirigido por Tom Payne, pelo qual tornou-se a primeira brasileira a concorrer a um Leão de Ouro como melhor atriz coadjuvante. Perdeu (mas por muito pouco) para Lilli Palmer (1914-1986). “Quando veio a notícia de que Lili Palmer tinha ganho o prêmio e eu tinha perdido por dois votos. Dois votos… Então, a Katherine Hepburn e a Michèle Morgan [atrizes que também concorriam ao galardão máximo do Festival de Veneza] ficaram para trás, ficaram em quarto lugar, não sei.. Para mim, foi como se eu tivesse ganho o prêmio, foi muito importante para a minha carreira, inclusive”, lembrou Ruth.
Trabalhou por mais de sete décadas, tendo atuado em mais de 30 filmes, além de dezenas de peças de teatro. Mas também foi gigante nas telinhas. Deu vida a personagens de mais de 20 novelas na TV Globo, emissora para a qual trabalhou por 50 anos. “Trabalhei muito nesses 70 anos de carreira. Nunca parei, o que é algo difícil para qualquer ator no mundo, ainda mais para um ator negro”, disse ao jornal O Globo.
A luta contra o racismo também foi uma marca da sua trajetória. Sempre se posicionou e costumava contar que teve de lutar muito por bons papéis, embora a modéstia fosse outra marca da sua personalidade: atribuía o sucesso à “generosidade” das pessoas. Mas, na verdade, foi Ruth de Souza quem foi generosa com gerações e gerações que vieram depois dela. “Ela veio antes de todas nós. Ela veio antes da Chica Xavier, ela veio antes da Lea Garcia, antes da Zezé Motta. Ela veio antes de muitas antes de nós. Sempre com um talento arrebatador, um profissionalismo pra se destacar, um encanto e um respeito pela profissão, quando essa profissão não era respeitada, quando atrizes não eram respeitadas nem admiradas. Ela abriu todas as portas, ela escancarou essas portas”, definiu a atriz Taís Araújo.
Ruth de Souza se despediu da televisão em 2019, na minissérie “Se eu fechar os olhos agora” (TV Globo), no mesmo ano em que morreu, aos 98 anos. Deixou um legado que jamais será esquecido e que hoje é celebrado em um doodle do Google, que faz homenagem a Ruth de Souza pelos 100 anos de arte e inspiração.