Por Rodrigo Montezzo
Já era de conhecimento público que a base governista entraria em campo para tentar impedir ou atrasar a instalação e início dos trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Pandemia no Senado, ordenada na semana passada em decisão liminar pelo ministro Luís Eduardo Barroso, do Supremo Tribunal Federal. Não deu certo. A CPI foi oficialmente criada com a leitura do requerimento de abertura pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG). Os apoiadores do presidente enxergam que ele conseguiu uma vitória, ao menos parcial. Eu discordo e explico o porquê.
Em primeiro lugar, muito se falou que o presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), fez uma fusão entre os requerimentos de Randolfe Rodrigues (REDE-AP) e Eduardo Girão (Podemos-CE), este último, claro apoiador de Jair Bolsonaro e líder do governo no Congresso, que pretendia a criação de outra CPI para averiguar desvios no repasse de recursos do Governo federal a Estados e municípios, para a qual havia conseguido 45 assinaturas. Mas isso foi por água abaixo quando a Secretaria-Geral da Mesa do Senado emitiu parecer afirmando que o regimento interno da Casa, em seu artigo 146, impede que os senadores investiguem a conduta de governadores e prefeitos em uma CPI, conforme era a vontade da ala governista. Entretanto, ela informou também que é prerrogativa do Senado investigar o envio dos recursos federais a estados e municípios. E é exatamente nisso que os bolsonaristas estão se apegando. Mas na prática não é bem assim.
O próprio Randolfe concorda, obviamente, se aparecer desvio de dinheiro federal mandado para os Estados e houver evidências, é claro que deve ser investigado. Mas não é uma CPI para investigar governadores e prefeitos como queria Jair Bolsonaro, por conta do artigo citado acima.
Dessa forma a CPI está dentro do que foi inicialmente prevista. E para piorar o cenário governista, tem ainda a composição da mesma, observem.
Governistas mesmo, daqueles que irão até o fim com o presidente, são apenas três: o Eduardo Girão (Podemos-CE), o Marcos Rogério (DEM-RO) e o Jorginho Melo (PL-SC).
São claramente de oposição: Randolfe Rodrigues e Humberto Costa (PT-PE).
Agora, os ditos independentes:
Eduardo Braga (MDB-AM) tem feito um claro discurso contra as maluquices do governo Bolsonaro e é do Amazonas. Lembrando que o desastre ocorrido nesse estado foi o estopim que culminou na abrtura dessa CPI.
Renan Calheiros (MDB-AL), no que diz respeito a gestão da Covid pelo governo federal, é abertamente um crítico.
Otto Alencar (PSD-BA), do partido do Kassab, que tem uma mescla de governistas e oposição. Mas no caso desse senador, ele faz parte daqueles que se colocam na ala de oposição ao governo Jair Bolsonaro e também é absolutamente crítico.
Tasso Jereissati (PSDB-CE). Apesar do partido não ser abertamente de oposição ou situação, nesse caso, não é possível que ele seja condescendente com o governo, já que um dos alvos bolsonaristas e claro desafeto, é João Doria, governador de SP e grande nome do partido.
Omar Azis (PSD-AM), outro que na questão da Covid é crítico.
Por fim, Ciro Nogueira (PP-PI), é presidente do PP, governista, mas não é doido. Será que, como presidente de partido, vai querer colocar governadores e prefeitos na berlinda?
Portanto, apesar da pressão para transformar a CPI num palco de guerra, o governo não conseguirá emplacar essa estratégia e a Comissão, por conta desse cenário, não foi um tiro que saiu pela culatra.
O que é fato, será o ex-ministro Pazzuelo tendo que explicar as escolhas que ele fez, a mando de quem e porque as fez. Como foi que se deu, por exemplo, a expedição de médicos no Amazonas para impor a hidroxocloroquina como método de tratamento. Quando foi que recebeu a notificação da crise de oxigênio do Amazonas e quais foram as providências tomadas. Estas e outras graves questões terão que ser respondidas.
Inclusive porque a conversa do mal uso do dinheiro pelos Estados e municípios é conversa fiada, e o governo sabe disso. Primeiro porque não é verdade que foram enviados bilhões para a saúde. Esse dinheiro foi enviado em compensação pelas perdas de ICMS por conta da pandemia. E legalmente esse valor era para o orçamento, não apenas para a saúde, mas para todas as demais despesas, inclusive pagamento da PM, professores, etc. Quando o Estado tem a queda da arrecação de ICMS, ele fica sem caixa, já que é sua principal receita.
Estava tudo pronto para colocar governadores e prefeitos na guilhotina, mas deu tudo errado. É bom lembrar que, se não fosse o esforço de governadores e prefeitos, excetuando os que fazem parte da caterva bolsonarista, a situação no Brasil seria ainda pior.
Se já não bastasse as mortes, ainda viramos um país pária, inclusive alvo de piada internacional.
Apesar de Jair Bolsonaro, iremos sair dessa.