Mais um avanço científico referente ao novo coronavírus. Dois novos testes de Covid-19 são patenteados no Brasil. Pesquisadores da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) patentearam dois novos testes para detecção do novo coronavírus (Sars-Cov-2) na saliva. Ambos têm alta sensibilidade e, se produzidos em larga escala por empresas parceiras, podem possibilitar a testagem em massa da população brasileira – solucionando um dos gargalos para o enfrentamento da pandemia de Covid-19.
Uma das tecnologias envolve um sensor eletroquímico que permite fazer uma análise quantitativa da proteína spike (espícula) na saliva do paciente. “Esse é um modelo de teste rápido e portátil. Tem grande sensibilidade e se assemelha aos dispositivos que medem a quantidade de glicose [glicosímetro], utilizados por diabéticos. Nele, um sensor eletroquímico capta a proteína spike e o resultado pode ser acessado, em questão de minutos, por meio de um aplicativo de celular”, conta Ronaldo Censi Faria, pesquisador do Centro de Ciências Exatas e de Tecnologia da UFSCar e coordenador do projeto.
Uma grande vantagem em relação aos testes de antígeno já disponíveis é o fato de o novo método dispensar a coleta de secreção por swab nasal (cotonete longo inserido pelo nariz).
O outro teste desenvolvido pela equipe detecta na saliva o RNA do vírus com precisão semelhante à do RT-PCR – exame considerado padrão-ouro para diagnóstico da Covid-19. No entanto, trata-se de um método mais rápido e econômico, pois usa menos reagentes.
Outra vantagem da inovação está em permitir que mais amostras (de diferentes pacientes) sejam verificadas ao mesmo tempo. Para tanto, foi adaptada a plataforma Elisa (ensaio de imunoabsorção enzimática, na sigla em inglês), amplamente utilizada em laboratórios de análises clínicas de todo o Brasil.
Essa técnica é geralmente usada para fazer testes imunoenzimáticos, que permitem a detecção de anticorpos específicos para um determinado patógeno. A plataforma é composta por uma placa com 96 pequenos poços nos quais fica aderida uma proteína viral capaz de ser reconhecida pelo sistema imune humano, o que permite analisar amostras de 96 indivíduos ao mesmo tempo, garantindo agilidade no diagnóstico.
“O pulo do gato da técnica que desenvolvemos foi adaptar o equipamento, geralmente usado para detecção de anticorpos, para fazer a leitura de material genético [RNA] do vírus. Isso é uma novidade que nunca tinha sido desenvolvida. Como o método Elisa é muito difundido e está disponível em qualquer laboratório de análises clínicas do país, seu uso traria maior capilaridade e agilidade no diagnóstico da Covid-19. No futuro, pretendemos aproveitar essa inovação no desenvolvimento de testes para outras doenças”, diz o pesquisador à Agência Fapesp.
Faria ressalta que a agilidade também está relacionada com o fato de o novo teste pular algumas etapas do RT-PCR, método que requer a extração do material genético, depois um processo de transcrição do RNA em DNA e, por último, a amplificação (multiplicação) do DNA.
“O teste que desenvolvemos é mais direto. Detectamos o material genético por meio de partículas magnéticas atraídas por ímãs e, ao adicionar o reagente, obtemos uma cor que vai indicar se é positivo ou negativo”, explica.
Tanto o teste eletroquímico rápido quanto o modelo colorimétrico, que possui a precisão do RT-PCR, utilizam partículas magnéticas atraídas por ímã. “Modificamos essas partículas de tal forma que elas conseguem ‘pescar’ o alvo, seja a spike, seja o RNA viral. O método que captura a espícula é eletroquímico, uma resposta de corrente é gerada quando a proteína do vírus é detectada. Já no outro, depois da captura do RNA, utilizamos um reagente que vai gerar cor à amostra quando o resultado for positivo”, conta.
De acordo com Faria, essa estratégia confere maior sensibilidade ao teste. “É ela que possibilita o diagnóstico mesmo com concentrações baixas de material genético na amostra. As partículas magnéticas são o cerne dos métodos que desenvolvemos”, diz.
Os dois projetos tiveram apoio da Fapesp e da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).
Uma fábrica de novos testes de Covid-19 e outras doenças
O Laboratório de Bioanalítica e Eletroanalítica (LaBiE) da UFSCar tem desenvolvido uma série de outros testes. De acordo com Faria, a metodologia usada no caso da Covid-19 é uma adaptação de dispositivos que estão sendo criados para diagnosticar doenças como câncer, leishmaniose, hanseníase, zika e Alzheimer.
“O teste eletroquímico é praticamente uma adaptação para a Covid-19 de outro dispositivo que fizemos para detectar Alzheimer. Já o teste colorimétrico, que se compara em precisão ao RT-PCR, é uma tecnologia completamente nova, não tínhamos pensado ainda nesse modelo para nenhuma outra doença”, conta.
O pesquisador conta que costuma trabalhar em parceria com médicos e especialistas de outras áreas. O dispositivo para detecção do Alzheimer, por exemplo, foi uma colaboração com a professora Márcia Cominetti, do Departamento de Gerontologia da UFSCar. Já os testes de Covid-19 foram desenvolvidos com o grupo da professora Ester Sabino, docente da Faculdade de Medicina e do Instituto de Medicina Tropical da Universidade de São Paulo, além de Matias Melendez, hoje pesquisador no Hospital Infantil Pequeno Príncipe, em Curitiba. Dessa forma, dois novos testes de Covid-19 são patenteados.
Antes de terem as patentes depositadas, os dois testes para detecção do Sars-Cov-2 foram validados em amostras de saliva de pacientes atendidos em hospitais de São Carlos e São Paulo, ambos chegando a uma sensibilidade superior a 90%. Os pesquisadores agora pretendem criar parcerias para utilizar o método colorimétrico em escolas das duas cidades.
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